domingo, 7 de julho de 2019

Preciso falar sobre a Rádio Globo...

Nos últimos 6 anos, compartilhei, neste blog, os mais diversos sentimentos. Está aqui tudo que é ou foi importante pra mim. E por que não falar da Rádio Globo? Não é novidade pra ninguém que a emissora sempre foi uma das paixões da minha vida. A primeira publicação desta versão do meu diário virtual, o ‘Campo Minado’, ocorreu em abril de 2013. De todos que criei até hoje (foram alguns), este é o mais longevo, talvez porque há 6 anos já tivesse atingido o grau de maturidade suficiente para não me arrepender posteriormente de algo que escrevi. Em 2013, os 30 já estavam batendo à porta, meu pai já havia morrido, já era formado em rádio e em jornalismo, já tinha casado e separado e estava realizando um dos maiores sonhos da minha vida: trabalhar na Rádio Globo. Ouso dizer que esse é o sonho de 9 entre 10 pessoas que pretendem fazer carreira no rádio. 

Meu texto não será de “viúva”, pois já existem muitas na internet. Pessoas que tentaram se segurar em suas cadeiras até o último segundo, mas após a demissão, ao invés de procurarem outro emprego, gastam energia para falar mal da empresa. Eu acho patético. Quando alguém me manda um link de um site ou blog criticando a Rádio Globo, eu pergunto: “Fulano pediu demissão ou foi demitido?” Se pediu demissão, tudo bem, até penso se devo ler ou não. Agora, se foi demitido, é só mais um amargurado. Não tenho tempo pra perder com essa energia ruim.
Há alguns dias, estava numa mesa acompanhado por amigos radialistas. Em algum momento do papo, foram citados os locutores que integrarão a nova fase musical da Rádio Globo. Dos 3 contratados, dois pediram desligamento das empresas onde trabalhavam há anos, posicionadas no ibope à frente da Rádio Globo. Alguém na mesa enfatizou: “Eles são malucos!” Porém, outro amigo questionou: “Vamos ser sinceros, quem aqui falaria não para a Rádio Globo?” Um silêncio constrangedor tomou conta do ambiente. É isso, todo radialista quer ter um carimbo da Rádio Globo na Carteira de Trabalho. Quem trabalhou na emissora e passou a falar mal após ser demitido, voltaria a trabalhar lá ganhando 30% do que recebia anteriormente, garanto.
Ingressei como estagiário, após 4 etapas de um processo seletivo com quase 500 participantes. Eram apenas 6 vagas, fiquei com uma delas. Nem sabia qual era a minha carga horária obrigatória, pois queria ficar lá o dia inteiro. Após 5 meses acompanhando o trabalho das equipes de jornalismo e esporte das rádios Globo e CBN, fui contratado como trainee. De cara, fui mandado para o Centro de Operações da Prefeitura, onde junto com o Genilson Araújo, então repórter aéreo do SGR, éramos as vozes mais ouvidas nas manhãs do rádio carioca, pois entravávamos no ar na Globo, CBN e Beat 98. Juntando a audiência das 3, dava cerca de meio milhão de ouvintes. Antes de ser efetivado como repórter, já havia assumido o microfone de um dos “Amarelinhos”, o carro de reportagem mais famoso do país, no horário nobre do rádio. Foram 3 anos como repórter, sempre tendo a prestação de serviço como principal marca do meu trabalho. Quando a rádio acabou com a reportagem de rua, em 2016, assumi, contra a minha vontade, a produção/coordenação de estúdio do Show do Antonio Carlos. Já falei sobre esse episódio aqui.

Em abril de 2017, a tradicional Rádio Globo, que em 72 anos de existência, foi a principal emissora do país por pelo menos 4 décadas, chegou ao fim. Todos os medalhões da rádio foram dispensados. E por mais questionem até hoje aquela decisão, a conta é simples: a rádio gastava mais do que ganhava, mesmo sendo líder de audiência em alguns horários. Algo precisava ser feito, urgentemente. 
Naquela época, alguns jovens eram considerados as apostas para o futuro da emissora. Acredito que eu estava entre eles, acompanhado por Ana Paula Portuguesa, Guilherme Grilo e Bruno Mattos. Porém, o projeto ‘Nova Rádio Globo’ colocou nossas pretensões na gaveta. No dia da apresentação do projeto inovador realizada pelo novo diretor da emissora, foi dita a famosa frase (no meio do rádio): “Vocês não entraram aqui sabendo tudo. Agora, vocês vão ensinar a quem nunca fez rádio” referindo-se aos artistas da TV que assumiriam os microfones da emissora. Não demorou muito até perceberem que mais do que ensinar, os “vocês radialistas”, como éramos chamados no início, precisavam estar presentes no microfone, sim! E mesmo não tendo vinhetas com os nossos nomes, aproveitamos muito bem todos os espaços que nos sobraram. Alguns até se destacaram mais na Nova Rádio Globo do que na antiga.
No início, como todos os outros antigos funcionários, achei tudo uma loucura. Mas quando o projeto completou um ano, já estávamos entregando, em alguns horários, produtos relevantes e realmente inovadores aos ouvintes. Outro fato positivo foi que o clima na redação/central de produção ficou muito mais leve e saudável. Como não havia mais a competição para ser o novo Haroldo de Andrade (ninguém seria capaz), todo mundo passou a trabalhar em equipe, algo que não acontecia na fase anterior, quando as equipes dos programas eram rivais, alguns comunicadores se odiavam, um torcendo pelo fracasso do outro. Na Nova Rádio Globo, todo mundo trabalhou junto para que desse certo. Desafetos que fiz na antiga Rádio Globo, foram bons e respeitosos colegas de trabalho no novo projeto. O nome ‘Rádio Globo’ depois do ‘Nova’ pesou muito, por isso, os números da audiência não traduziram a qualidade do que estava indo ao ar. Foi um risco que a empresa resolveu correr.
Ao mesmo tempo em que continuou utilizando o nome Rádio Globo, a empresa decidiu esquecer o passado a todo custo. Não foram comemorados os 73 e os 74 anos da emissora, em 2 de dezembro de 2017 e 2018, respectivamente. O aniversário passou a ser comemorado em 12 de junho, data que marcou a estreia do projeto ‘Nova Rádio Globo’, em 2017. Todo o conteúdo do site, que durante anos foi o mais acessado entre todas as emissoras de rádio do país, foi apagado após uma decisão tomada numa conversa de 30 segundos, que tive o desgosto de presenciar, causando uma perda irreparável na memória recente do Brasil. Quantas entrevistas, em programas como o Manhã da Globo, pautaram o noticiário do país no resto do dia. E as reportagens exclusivas? Meu Deus! Todo esse material foi pro lixo, tirado da eternidade, porque não dava pra atualizar os links antigos com o layout da nova rádio. Imagine se os portais de notícias apagassem todo o seu histórico quando o design do site fosse atualizado. No ano passado, quando decidiram homenagear o passado da emissora produzindo uma reportagem sobre os 74 anos de sua fundação, o funcionário que foi designado para a função, por trabalhar na capital paulista da emissora, não se deu ao trabalho de fazer qualquer pesquisa, produzindo uma matéria citando Fausto Silva, Gil Gomes, Osmar Santos e outros grandes nomes que passaram pela Rádio Globo de São Paulo. O único problema dessa história é que a Rádio Globo, a primeira empresa fundada pelo Dr. Roberto Marinho, que tem 74 anos de existência, é a do Rio de Janeiro. E na reportagem que celebrou essa data não foram citados Haroldo de Andrade, Waldir Amaral, José Carlos Araújo, Antonio Carlos e tantos outros que fizeram da emissora carioca a maior do país. A minha maior (talvez única) tristeza com o projeto Nova Rádio Globo foi o fato de ter transformado o glorioso passado num inimigo, ao invés de se aliar a ele. O meu respeito pela história da Rádio Globo sempre foi tão grande que ao usar os microfones mais antigos (cromados da marca Shure), eu pensava: “Caramba, esse já deve ter sido usado por fulano ou sicrano”. Quando a emissora ainda estava no famoso endereço Rua do Russel, 434 – Glória, eu passava pelo busto do saudoso Haroldo de Andrade todos os dias, na estação de metrô do bairro, e o cumprimentava acenando com a cabeça, como estivesse pedindo a bênção do maior comunicador da história para falar no poderoso microfone da Rádio Globo.
No entanto, nos dois anos do projeto, também foram muitas alegrias, tão importantes quanto as que tive na fase anterior. A cobertura que fizemos das Eleições do ano passado, me marcou como as manifestações de 2013, a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Rio 2016. A equipe da Nova Rádio Globo era pequena, mas muito competente. Ninguém estava lá porque era aluno de A ou da família de B. Não tinha espaço pra quem não gostava ou não sabia trabalhar.
Mais uma vez, mesmo sendo mais econômica, a rádio não atingiu o que era esperado financeiramente. E o projeto acabou assim que completou dois anos. Com ele, chegou ao fim também o departamento de jornalismo da emissora, um dos mais importantes da história do rádio brasileiro, do qual eu fazia parte.
Após 6 anos e 5 meses, fui demitido com mais uns 30 funcionários (apresentadores, jornalistas, profissionais de marketing, sonoplastas e técnicos). Nesse período na empresa, descobri o profissional que eu preciso ser e também aprendi qual eu não aceitaria ser nunca. Como jornalista, absorvendo ao máximo do convívio com as minhas maiores referências na profissão, fui incansável e busquei ser inquestionável. Me orgulho por nunca ter precisado dar um direito de resposta sequer por alguma reportagem produzida por mim. Namorei a colega de trabalho que sentava ao meu lado na redação e depois, uma ouvinte, que um dia me enviou uma mensagem numa rede social, em tom de esporro, por não concordar com algo que noticiei. Fiz grandes e eternas amizades. Caí da cadeira de tanto rir durante um plantão na madrugada. Também já voltei pra casa com a coluna travada de tanto estresse. Realizei sonhos que eram inimagináveis. E o mais importante da minha carreira na Rádio Globo: fui a voz de muita de gente que não era ouvida!

Ainda neste mês de julho, estreia uma terceira versão da Rádio Globo, totalmente diferente das anteriores. Se será melhor ou pior, os ouvintes que vão dizer, pois eles sempre serão os verdadeiros gestores da emissora. Enquanto existir Rádio Globo, seja lá qual for, estarei na torcida, pois poucos nomes são tão importantes na minha vida quanto esse.

Obrigado, Rádio Globo!

P.S.: muitos ouvintes me perguntaram por que fiquei afastado do microfone da emissora na última semana do extinto projeto. Como muitos sabem, eu estava apresentando o Café das 6 com o Fernando Ceylão, no dia 21 de junho, quando ele fez uma brincadeira citando no ar outras emissoras poderiam contratar a equipe do programa. Alguém não gostou da piada feita pelo Ceylão (que antes de qualquer outra função que exerça, é humorista) e além de afastá-lo, me colocou no cantinho da disciplina: ficar a semana derradeira do programa dentro do estúdio, mas sem poder falar no ar. Como profissional que sou, acatei a decisão, só me pronunciando no último dia, para me despedir de quem realmente importa: os ouvintes. Eu não sei qual legado o autor dessa decisão vai deixar na emissora, quer dizer, na verdade, eu imagino. Acho que você também. Já no meu caso, fui o primeiro estagiário na história da Rádio CBN (que já existia há 22 anos na época), que foi creditado como colaborador no fim de uma reportagem, por causa da contribuição na matéria sobre a descoberta dos explosivos no terreno de Deodoro, onde querem construir o novo autódromo do Rio. Fui o funcionário que no menor espaço de tempo foi de estagiário a apresentador de um programa em toda história da Rádio Globo. Após exatos 2 anos e 1 mês da minha contratação como estagiário, assumi por alguns meses a apresentação do programa ‘Sucessos da Globo’, nas madrugadas de domingo para todo o país. Desde 2005, a Rádio Globo do Rio só foi finalista em prêmios de jornalismo duas vezes. Idealizei, produzi e apresentei as duas séries de reportagem premiadas. Em ambas as ocasiões, a Globo foi a emissora de rádio mais bem colocada. Quando emplacar notícias na home da Globo.com era tão importante quanto o conteúdo que ia ao ar, fui o único repórter da emissora (talvez do SGR inteiro) que teve duas reportagens simultâneas (assuntos distintos) em destaque no portal de notícias que concentra todas as empresas do Grupo Globo. Já na fase Nova Rádio, produzi , coordenei o estúdio e apresentei interinamente o Café das 6, programa que, em pesquisa recente realizada com ouvintes, foi o mais bem avaliado da emissora, além de ter alcançando a liderança na média do ibope no horário em relação as duas emissoras de notícias concorrentes. Se a intenção era me punir por algo que eu nem fiz, bastava ter pesquisado um pouco sobre o meu histórico para saber que a piada feita pelo meu companheiro de bancada não mancha a minha trajetória na Rádio Globo.

Momento da minha despedida na Rádio Globo:

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Calendário

O calendário não importa quando...
As almas se encontram
O abraço abriga
O sorriso ilumina
O olhar penetra
O beijo é ardente e doce
O suor se mistura
O suspiro soa como sinfonia
O respeito impera
O sonho se multiplica
O coração bate em outro peito
A saudade confirma
Dias, meses e anos não importam quando a paixão transforma a medida de tempo em eternidade
Quando o calendário perde a importância, o papel cheio de números passa a ser o bilhete premiado na loteria da vida

CANTHARINO, Renato

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Dez anos do dia que não terminou

Paizão, hoje, quando a sua morte completa 10 anos, não há porque ficar triste. No fim da tarde de 10 de janeiro de 2009, quando a minha mãe voltou do hospital e disse para que eu corresse para lá, pois de acordo com os médicos, aquele deveria ser o seu último dia, pedi a Deus, durante os vinte quilômetros que nos separavam, para que o senhor me esperasse. Cheguei a tempo e o senhor me concedeu os últimos 15 minutos da sua vida a sós naquele quarto. Foram os 15 minutos mais rápidos da minha vida, porém, suficientes para que eu falasse tudo que era necessário na nossa despedida. Quando eu comecei a rezar e os seus batimentos foram parando, eu não tive a menor dúvida que Deus estava naquele quarto te levando com carinho para o lado dele. Um silêncio perturbador tomou conta do sétimo andar daquele hospital. Mas não eu não era o único que estava chorando. O seu médico, que quatro anos antes era residente e participou da equipe que o salvou pela primeira vez, naquele plantão, era o responsável pelo andar. Eu tinha acabado de perder meu pai, minha maior referência. No entanto, ele também estava perdendo o caso que um dia foi o orgulho de uma equipe muito competente e dedicada. Ele foi o primeiro a entrar no quarto após o monitor cardíaco zerar. Com os olhos marejados e a tranquilidade de quem já esperava aquela situação, ele não disse nada, apenas me deu um abraço e logo em seguida posicionou as suas mãos ao lado do quadril. O senhor era muito mais amado do que imaginava. Naquela noite, o saguão do hospital parecia o quintal da nossa casa num fim de semana, quando muitos dos meus amigos ficavam batendo papo e brincando com o senhor.


Nunca vou conseguir retribuir o que eles, que também o consideravam como um pai, fizeram por mim, pela mamãe e pela Tatiana naquela noite. No dia seguinte, quando foi realizado o seu velório, a tristeza foi substituída por um momento de celebração do amor. Amigos que até então, nunca haviam entrado em um cemitério, mesmo que fosse para se despedir de parentes, debutaram naquele dia. Se um estranho chegasse naquele momento, teria dificuldade de identificar quem era realmente o seu filho de sangue, pois a dor parecia ser igual pra todo mundo. Por isso, quando chegou a hora de decidir o que fazer com as suas cinzas, não tive dúvida: o mirante de Paquetá, onde o senhor, no ano anterior, havia levado boa tarde da turma pra conhecer, num dia em que eu, o senhor e meus melhores amigos nos divertimos como crianças de 7 anos, mesmo com todos já na fase adulta.


Nesses últimos dez anos, muita coisa aconteceu, pai. Após trancar a faculdade de publicidade para estudar rádio, comecei a cursar jornalismo, dois meses após a sua morte. Já no primeiro dia de aula, conheci a mulher com quem eu me ‘casaria’ no ano seguinte. Ironicamente, ela faz aniversário no dia 10 de janeiro. Do grupo dos meus amigos que o senhor considerava todos como filhos, eu fui o primeiro a juntar as escovas de dente. Porém, fui o único que se separou. Rs... Seus outros filhos construíram famílias lindas e o Thiago, o que gente mais zoava, te deu até um neto, mas não foi o único. Muitos não estão mais morando no Rio, alguns até fora do país, mas mantenho contato com todos. Depois do casamento que deu certo por pouco tempo, tive algumas namoradas. Sempre pensava rindo: “essa o papai ia adorar” ou “o papai ia falar que essa é chatinha”. Nos últimos dez anos, novos grandes amigos entraram na minha vida e consigo imaginá-los colocando pilha no senhor pra me zoar, como faziam Thiago, Cabeça, Sanmer e outros. A minha maior qualidade continua sendo saber escolher bem as pessoas ao meu redor.


O senhor lembra quando eu estudava locução e ia trabalhar de graça em rádios comunitárias só pra treinar? O senhor ficava em casa mudando o rádio de local só pra conseguir me sintonizar, mesmo com muito chiado e ruídos. Então, quando me formei em jornalismo, ingressei na Rádio Globo, a emissora que eu ouvi com o senhor a vida toda para acompanhar os jogos do seu amado Flamengo. Que me perdoe o incrível José Carlos Araújo (Garotinho), mas o Edson Mauro sempre foi o nosso preferido. O moleque que ficava imitando o bordão “maaaaaaarrrrrque o tempoooo”, se tornou colega de empresa e amigo do ídolo. Se eu pudesse enviar apenas uma coisa para o céu, seria um rádio para que o senhor pudesse me ouvir em alto e bom som junto com a Tia Rosa e o Tio Áureo. Acho que o senhor ficaria bobo com o seu ‘filhão’. Quando o senhor partiu, o rádio era apenas um sonho meu, que acabou se tornando realidade da forma mais bonita. É, o senhor não teve um filho advogado e nem segui a carreira política, como foi o seu desejo no fim da vida, mas pode ter certeza, que nos últimos 6 anos, com o microfone na mão fiz mais justiça e lutei mais pela nossa cidade do que o homem da lei ou o vereador que eu poderia ter me tornado. Já fiz muita coisa bacana na carreira, mas o que mais mexeu comigo até hoje foi ser o repórter do Amarelinho em coberturas esportivas importantes, como a abertura da jornada esportiva da Copa do Mundo no Brasil ou a final da Copa do Brasil de 2013, quando o Flamengo sagrou-se campeão. Só o senhor vinha à minha cabeça durante as entradas no ar. Lembra também que eu ficava ao seu lado imitando o Alberto Brandão? Pena que o senhor não pôde ver como um dos substitutos dele nos jogos no Maracanã. Levei dois anos pra criar coragem de abordar o Edson Mauro e contar como o trabalho foi importante nos meus fins de semana com o senhor. Desde então, passamos de colegas de trabalho para amigos, que se falam sempre com muito carinho e respeito. A profissão também me proporcionou conhecer e me tornar amigo do Iseumar Pereira, o seu locutor preferido da JB e que fazia questão de ouvir todas as noites, mesmo quando estava internado. Ele ficou muito emocionado quando a contei história toda pra ele, principalmente a parte que envolve a música ‘Fragile’ do Sting. Dez anos depois, a minha mãe ainda chora toda vez que essa canção toca no rádio. Horas antes do senhor partir, passeio por uma loja de instrumentos musicais e comprei um violão. Ele está guardado, intacto, pois nunca aprendi a tocar instrumentos de corda. Até tive uma bateria por alguns anos, mas precisava fazer as pazes com os vizinhos e vendi. Quando o Thiago foi morar em São Paulo, me deu o piano que ele tinha em casa, mas tô com uma preguiça de entrar na aula. Mas não posso ir embora desse mundo sem saber tocar a música da sua vida no violão que comprei há exatos 10 anos:


Pai, me desculpa, mas nunca gostei de futebol. Torcia pro Flamengo só porque era a forma de acompanhá-lo num momento que te deixava tão feliz. Minha parada sempre foi automobilismo. Falando nisso, lembra qual foi o nosso último momento marcante em casa juntos antes do senhor ser internado pela última vez? Nós dois assistindo o GP Brasil de Fórmula 1 e o Felipe Massa ficou na posição de campeão por 35 segundos, tempo suficiente para que eu rasgasse a roupa numa crise eufórica e ficasse apenas de cueca gritando ao seu lado, enquanto o senhor me olhava assustado. Mas não adiantou nada, pois o Lewis Hamilton ultrapassou o Timo Glock e o sonho foi por água abaixo naquele temporal de 2 de novembro. Desde então, nenhum outro brasileiro chegou tão perto de ser campeão na principal categoria do automobilismo mundial.
Das coisas que fazíamos juntos, apenas uma não consegui continuar: assistir Chaves e Chapolin. Não faz o mínimo sentido ver pela trigésima vez o mesmo episódio sem ter o senhor ao lado pra rir, mesmo que antecipássemos todas as falas e piadas dos episódios. O dia da morte do Roberto Bolaños foi muito difícil pra mim, pois devia a ele milhares de horas que passamos juntos em casa durante 25 anos.
Sonhei pouquíssimas vezes com o senhor desde a sua morte, mas teve um momento em que te senti presente ao meu lado: show do Elton John na Apoteose, em 2017. Evitei algumas vezes de ir ao show de um dos nossos artistas preferidos, mas quando criei coragem, foi um momento lindo! Chorei mais do que cantei, mas de alegria. Ao mesmo tempo, tinha certeza que estávamos compartilhando aquele momento.
Nos últimos anos, comecei com um hobby que eu tenho certeza que o senhor ia adorar: antigomobilismo. Procurei, mas procurei muito por um Fusca laranja granada, igual ao seu primeiro carro. Cheguei a ir olhar um a mais de duzentos quilômetros daqui, mas não encontrei nenhum bom. Comprei um do mesmo ano do seu, mas é vermelho cereja. Fico pensado como o senhor, com a mistura de formalidade e sacanagem (no melhor sentido da palavra), seria popular no meio. Falando no seu jeito, minha mãe sempre diz que a cada dia minha personalidade está ficando mais parecida com a do senhor. Também me divirto tirando as pessoas mais próximas do sério e volta e meia falo uma frase absurda para poder deixar todo chocado e acabar com o assunto. Rs...
Lembra da Brooke, a gata que o senhor chamava de ‘preta ou branca’ ou ‘botafoguense’? Ela está enorme, parecendo um urso panda, só come e dorme. O Frajola morreu seis meses depois do senhor e a sua gata, a Beatriz Isaura, viveu pelo menos até 2016, quando a minha mãe foi obrigada a dá-la por causa de um problema com uma vizinha que estava grávida.
Da mesma forma que o senhor foi o pai para alguns dos meus amigos, Deus me presenteou com alguns pais emprestados nesses últimos anos. Tenho certeza que teve dedo seu quando pessoas como o Ricardo Ferreira e o Perrottão entraram na minha vida. A sua ausência física fez com que eu criasse um carinho especial por pessoas mais velhas, pois sinto falta de ouvir histórias.
Mamãe e Tatiana estão ótimas, mas se quiserem, elas que contem as novidades pro senhor.
Pai, pensando bem, acho que o senhor já sabia de tudo que te contei agora, né?
Obrigado por ter cultivado em mim o amor que te manterá vivo até o fim da minha vida!
Dê um abraço forte na Tia Rosa, no Tio Áureo, no David, no Betão, no Sr. Ademir, no Carlão e em tantas outras pessoas importantes que estão aí com o senhor. 
Um grande beijo, Paizão, Wanderlaan ou Sr. Cotonete!
P.S: Fica tranquilo que ainda vou te dar um Cantharininho.

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Só leve o necessário


O ano de 2018 vai ficar na minha memória como o período em que encerrei ciclos e me interiorizei. Olhar para si mesmo não é fácil, até porque nem todas as descobertas são agradáveis. Mas o que está dentro nos ajuda a entender o que está fora. Em fevereiro do ano passado, durante a despedida do meu melhor amigo que foi morar em São Paulo, saí numa foto sentado ao lado dele e aquela imagem me incomodou muito. Eu estava enorme, com 91 quilos, o maior peso que já tive até hoje. Mas não era só uma questão de aparência, eu sabia que aquele era o retrato de questões saúde e emocionais mal resolvidas. Era necessário ficar fora de cartaz, fechado para balanço até que compreendesse tudo o que estava acontecendo. A primeira medida foi viajar totalmente sozinho pela primeira vez na vida, mesmo estando namorando na época. Escolhi Curitiba, pois queria conhecer o Armazém Garagem, um bar que reúne duas das minhas principais paixões: rock e antigomobilismo. Fui sem planos para os 6 dias que em fiquei na cidade. Acordava, me arrumava e saía do hotel sem destino. Foi assim que conheci lugares incríveis e me apaixonei pela cidade. Tirando o “bom dia” para os funcionários do hotel e uma breve conversa com um casal de idosos na piscina, eu não falei com mais ninguém. Precisava de silêncio para me ouvir e me encontrar nas esquinas da cidade. Mesmo com a programação ‘freestyle’, visitei os principais pontos turísticos. De todos os lugares, o Parque Tanguá foi o que mais me marcou. Fiquei horas sentado olhando a queda d’água, um verdadeiro ritual de meditação. O primeiro dia desta viagem, 20 de fevereiro, marcou o dia em que abandonei o vício do café. Tomava em média seis copos da bebida por dia, o que só agrava a minha recém diagnosticada úlcera gástrica. A úlcera foi curada, mas um grave problema de refluxo ficou, atacando o meu esôfago com a acidez do estômago, o que prejudicou a minha voz durante boa parte deste ano. Foi a gota d’água, não dava pra aceitar que algo poderia ser evitado comprometesse a minha ferramenta de trabalho. Primeiro foi o café, depois o açúcar no achocolatado e a tão amada torta alemã que vende na lanchonete do trabalho.
Mas como disse no início, também existiam questões emocionais. De 2016 pra cá, quando chegou ao fim o meu relacionamento mais longo, eu tive mais 3 relacionamentos oficiais (conheceu família, amigos, colegas de trabalho e etc...) e um que não chegou a ser um namoro, mas durou alguns meses e foi tão relevante quanto os outros três. Em apenas dois anos, me envolvi emocionalmente com 4 pessoas. Todos esses relacionamentos com intervalos de no máximo 15 dias entre o fim do anterior e o começo do seguinte. É claro que nenhum deles poderia ter dado certo. O primeiro desses 4, foi bastante conturbado. Esgotei toda a minha energia emocional tentando provar que eu não era o homem mais desejado do universo e muito menos o mais infiel. Quando esse namoro, que durou apenas 8 meses, chegou ao fim, eu precisava de um tempo para me reconstruir o que foi levado pelo furacão. Foi nesse período em que tive a primeira crise grave de refluxo, ficando totalmente sem voz durante alguns dias. Porém, não fechei para balanço e em poucos dias a vida colocava outras pessoas especiais no meu caminho. Não sei se posso chamar de sorte, mas despertei o interesse de mulheres incríveis. Depois do primeiro encontro, eu sempre me questionava “por que não?”. Só que eu respondia apenas olhando pra outra pessoa e não pra mim mesmo. Convidava pra um segundo encontro e quando me dava conta, era um novo relacionamento. No entanto, eu ainda estava oco por dentro. Ofereci muitos sentimentos, como amizade, respeito e companheirismo, mas não conseguia retribuir o que recebia do coração alheio. O que poderia ter sido a minha sorte foi o azar das últimas mulheres que se envolveram comigo. Quando eu começava a reconsiderar a postura que tive no último relacionamento, já estava em outro. Não me dei a chance de pensar um pouco e depois de alguns dias/semanas, procurar a pessoa pra me desculpar e quem sabe, após reconhecer que precisava de um pouco de compreensão, tentar novamente. Porém, no último término, há quatro meses, ouvi uma frase que me impactou muito: “Renato, desejo que um dia você deixe de ser piscina rasa e vire mar”. Ela foi cirúrgica na definição, pois todo mundo que mergulhava de cabeça estava se machucando. Precisava voltar a transbordar amor, algo que eu fiz durante muito tempo, mas parecia ter esquecido. Foi aí que me toquei o quanto era cruel deixar pessoas se envolverem comigo sem estar preparado (ou com vontade) de pensar uma vida juntos novamente. Não tinha o direito de fazer outras pessoas pagarem pelo fracasso de um relacionamento anterior. Era o ápice do egoísmo. Setembro e outubro foram meses difíceis, pois me olhava no espelho e não tinha orgulho de quem eu via. Fiquei à flor da pele, tudo me atingia. A escrita continuou e mesmo não buscando conheci mulheres muito interessantes nos últimos meses, porém, fui honesto com elas e comigo mesmo, deixando claro que o máximo que tenho pra oferecer no momento é um jantar, um chopp ou a companhia numa roda de samba, sem a segunda vez. Agora acredito que apenas um encontro também pode ser incrível e se tornar uma lembrança que mereça ficar intacta. Assim, aos poucos, vou sentindo o meu coração voltar a bater.
Mas não apenas os últimos relacionamentos me fizeram querer recomeçar, o clima de ódio que envolveu a última eleição me afetou diretamente, principalmente quando eu via postagens de amigos nas redes socais. E não estou falando de eleitores do candidato A, B ou C. No geral, parece que todo mundo enlouqueceu e perdeu o respeito. Foi um período de desamor, que deixou resquícios ainda presentes. Os candidatos conseguiram despertar o pior das pessoas. Quando eu acessava o Facebook e via a foto de um pai fazendo arminha com a mão do filho de 3 anos, me dava vontade de chorar porque muitas dessas pessoas foram importantes na minha vida. Porém, não posso deixar que o ódio ande ao meu lado. Tomei uma atitude radical: excluí definitivamente o meu perfil do Facebook que existia há 9 anos e tinha contatos de pessoas de toda a minha trajetória. Em seguida, fiz o mesmo com a minha conta do Twitter. E por último, na semana passada, troquei o número do meu celular. Criar novas contas me deu o direito de filtrar as pessoas que são relevantes na minha vida atualmente. Seria mais traumático ter que apagar cada pessoa que não cabe mais no meu dia a dia. Criei um novo perfil no Facebook apenas para administrar as páginas e grupos dos quais sou moderador. Também fiz um novo Twitter apenas para seguir contas que me auxiliem no trabalho. Não era minha intenção desistir de pessoas, mas precisava deixar pra trás a maldade, o ódio e a negatividade. Estava me fazendo mal. Esse momento também foi propício pra que eu repensasse o meu senso de humor, sempre baseado em ironias ácidas. Meu humor é egoísta, pois a intenção sempre foi que apenas uma pessoa achasse graça. No caso, eu. Minha maior diversão sempre foi enviar ou responder mensagens de forma muito seca, saindo do óbvio e deixando o outro na dúvida se estou falando sério ou não. Enquanto estou gargalhando, a outra pessoa fica pensando mil coisas, tentando se explicar ou se desculpar pelo que não fez. Tá, eu sei que é um humor babaca, mas as pessoas mais próximas entendem e, às vezes, até se divertem também. Porém, nem sempre acontece. Até as pessoas que melhor me conhecem também ficam chateadas. Há algumas semanas, uma das pessoas mais importantes da minha vida me enviou duas imagens: antes e depois de estar maquiada para uma sessão de fotos para a empresa em que trabalha. Ela estava linda, o que todo mundo já devia ter falado, mas esperava ouvir isso de mim também. Porém, eu apenas respondi perguntando se ela estava fazendo um novo book de 15 anos. Ela me chamou de estúpido e ficou alguns dias sem falar comigo. Foi aí que percebi que meu humor espírito de porco estava passando dos limites, pois me divertia deixando as pessoas que eu mais gosto com raiva. Quando acontece com alguém que me conhece bem, depois de alguns dias, tudo volta ao normal e sou desagradável novamente. No entanto, quando ajo assim com alguém que acabou de me conhecer, provavelmente não terei a chance de provar que essa é a minha forma de brincar com quem eu gosto. Não é fácil explicar para uma namorada que ‘muito linda’ é uma ironia e que ‘muito mala’ é quase uma declaração de amor. Às vezes, consigo. Às vezes, não. Estou tentando me policiar, pois deve ser mais divertido rir junto.
Após os difíceis meses de setembro e outubro, em novembro, fiz a segunda viagem do ano sozinho: Foz do Iguaçu com passagens pela Argentina e Paraguai. Foi tão bacana quanto a de Curitiba. Também foi ‘freestyle’, sem compromisso com nada ou com ninguém. Porém no quinto e penúltimo dia, me permiti socializar com outras turistas durante a visita ao Templo Budista. Depois, fomos almoçar juntos e até falei meu nome verdadeiro, o que não fiz em Curitiba, quando tentaram puxar assunto comigo num bar. Voltei renovado de Foz.
Enquanto cuidava do emocional, estava também empenhado em ter uma saúde melhor. Além de abandonar o café, reduzi em 95% o consumo de refrigerante, passei a me alimentar seguindo orientações médicas e voltei pra academia. Resultado: no último dia de 2018, estava pesando 81 quilos, 10 a menos do que em  fevereiro, quando saí na foto que me incomodou. Mas foi muito além do que a questão da aparência, pois na última semana de 2018, a médica me liberou, após 6 anos de uso contínuo, dos remédios para controlar o colesterol e a tireoide, que tinham taxas perigosamente desreguladas desde 2014. Nos últimos anos, fui parar duas vezes na emergência de um hospital, durante a madrugada, achando que estava tendo um princípio de infarto. 
Apenas uma questão de saúde ainda não consegui resolver totalmente, que é o refluxo. Em Foz do Iguaçu, não respeitei o jejum de três horas antes de deitar. Encerrei todos os dias comendo nachos e outras guloseimas, sempre acompanhadas por alguns copos de Budweiser, num bar de comida mexicana. Acabei com o meu estômago e até agora não estou 100%, o que causa crises de tosse seca. Mais uma vez precisei tomar uma decisão radical e foi o que fiz: o réveillon marcou também o último dia em que consumi bebida alcoólica. Dependendo da ocasião, pretendo até abrir uma exceção para o vinho, mas cortei definitivamente a cerveja dos meus momentos de lazer.
Uma das músicas da minha vida é ‘Walk On ‘ do U2. Encerro este enorme texto com a minha parte preferida da canção:
“Tudo o que você produz
Tudo o que você faz
Tudo o que você constrói
Tudo o que você quebra
Tudo o que você mede
Tudo o que você sente
Tudo isso você pode deixar pra trás.”

Vamos amar e sempre buscar o melhor de nós mesmos em 2019!